quarta-feira, 22 de abril de 2009

Sobre mulheres e bolachas

Era quarta-feira e ele saía da piscina contente com a série de braçadas que acabava de executar. Estava cansado mas sentia uma satisfação enorme, daquelas que só muito exercício pode causar.
Entrou no vestiário para tomar uma ducha e pegou uma conversa pela metade, dois colegas de natação travavam o seguinte diálogo:

(sujeito empolgado) - O que é que você vai fazer no fim de semana? Vai pra praia?
(o outro)- Sabe que não sei ainda, você vai pra lá?
(se)- Eu vou, vai ter Garota Verão lá rapaz!
(oo)- Ah é... E o que é que é isso?
(se)- Ah é um concurso mó massa, as menininhas ficam lá andando de biquíni e tal, um monte de gatinha desfilando. Vamo lá cara, o baguio é da hora.
(oo)- hummm, acho que não vou não.
(se)- Ué, não vai porque rapaz?
(oo)- Prefiro ficar em casa vendo TV e comendo bolacha.

...

O rapaz debaixo da ducha teve de espremer a boca pra conter o riso.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Papo de elevador

Voltava do mercado com as mãos cheias de sacolas quando encontrou o vizinho na porta do prédio.
O homem gordo de bigode farto deve ter uns quase 70, usa all star cano longo surrado, bermuda cáqui, camiseta azul e nenhum relógio.
Sem dizer palavra alguma ele abre a porta e a segura até que a menina carregada de morango e suspiro fique a salvo do lado de dentro.

- Obrigada.

Ele acena com a cabeça, boca fechada, nada de dentes.
Ela passa toda a compra pra uma só mão e aperta o botão, enquanto o vizinho fecha a porta da frente ela mantém aberto o elevador esperando ele entrar.

- Obrigado.

Ela acena com a cabeça e fica olhando para o chão. Elevador é mesmo um negócio estranho, constrange a gente sem motivo algum.

- Uma mão lava a outra.

Ele diz isso olhando metade para a menina, outra parte para o chão.

- É verdade.

Ela abre um sorriso tímido e fixa os olhos no all star jeans desbotado e mal amarrado.

- Educação.

Ele deixa a palavra solta no quadrado do elevador e continua:

- Visse o que aconteceu lá no Rio? Se as pessoas fossem educadas nada daquilo aconteceria. Você menina não se contenta com pouco, podia ser só bonita, mas não. Além disso é muito educada.

Ela ri um riso sincero, ele retribui mostando os dentes entre o bigode.
O elevador pára no 6, é o lugar dele.

- Tenha um bom dia menina.
- Você também.

A porta fecha e ela sobe mais dois andares.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O coelho é de chocolate

Hoje é quinta-feira e logo Páscoa.
E eu sei que ando faltando à missa, e muito, mas hoje senti que quero mais que ovos.
Decidi encarar o espírito da coisa e renascer. Renovar, mudar, aproveitar a oportunidade de rever.
Amanhã eles chegam pra me ver, mãe e Ri, carregados de carinho, afeto e saudade.
E eu vou buscá-los vazia, limpa, com espaço para guardar tudo de bom que me oferecerem.
Comigo vai só o amor. Os dois, abstrato e concreto. E juntos, um ao lado do outro carregaremos as malas e levaremos pra casa um pedação de família.
Finalmente vou contar à minha mãe sobre aquele dia, um Sábado de aleluia muitos anos atrás.
Naquele dia eu fui dormir ansiosa demais para pegar no sono e sem querer, por debaixo do cobertor furadinho, percebi que ela dava passos pequenos pra ajeitar na cestinha de papel um ovo bem grande e vermelho. Fiquei bem triste, mas não contei nada para o Ri, afinal já havia dito que Papai Noel era lenda e ele muito otimista não acreditou em uma só palavra, jurando e gritando que se ele ganhou um carrinho era porque Papai Noel trouxe, oras!
Ontem recheei a casa de ovos e bombons para esperá-los, mas não vou repetir a cena da páscoa passada, aquela em que comi um número 15 inteiro em uma só sentada, intercalando pedaço branco com preto e depois preto e branco juntos, branco mais uma vez, preto, até que sobrasse todo o papel amassado no meu colo.
Esse ano vou sentir o gosto doce do chocolate amargo, devagar, diferente.
Vou dividir todo o chocolate que costumava esconder do Ri quando a gente era pequeno.
Vou cozinhar o almoço de Domingo e deixar minha mãe sentada na cozinha com uma taça de vinho, seu cigarro light e toda nossa conversa atrasada no ar.
Nessa Páscoa quero ressurgir.
Com as mãos sujas de chocolate.
A nova Páscoa de Leticia está começando agora.

Uma Nova Páscoa para todos que passam por aqui,