sexta-feira, 24 de julho de 2009

Tia Cacilda

Durante a semana, depois das aulas, esperava ansiosamente que a mãe a levasse para uma tarde feliz na casa da tia Cacilda.
Quando a mãe cedia ela procurava nos armários de sua casa qualquer enlatado ou um punhado de batatas para levar consigo, esquecia as barbies e os jogos e implorava para a mãe que passassem antes no super mercado pra ela comprar ingredientes para a tarde no fogão.
A mãe, sempre carinhosa, acompanhava a filha entre as prateleiras e escolhia com ela coisas fáceis de preparar: milho-verde em conserva, tomate fresco, salsicha, leite condensado e afins.
Despediam-se em frente ao portãozinho e tia Cacilda já ia logo carregando as sacolas da menina e elaborando com ela o cardápio do dia.
Juntas elas montavam um fogão de tijolos no pequeno quintal, a tia acendia o fogo e alertava a menina pra que ela não se queimasse, trazia da cozinha as panelas mais velhas, todas com a tampa errada, e faziam todo o tipo de comida que a imaginação permitisse.
A menina adorava aquilo, preparava tudo com o maior cuidado, provava, mais uma vez, outra, acertava o sal, media a água para o arroz.
A tia, econômica que só, juntava as cascas da batata e depois as fritava em óleo quente, a menina gulosa achava aquilo uma delícia!
Gostava também da maria-mole, do arroz com molho de tomate, da banana frita, do bolo de fubá e da pipoca no fim da tarde.
Antes que a mãe voltasse para buscá-la, tia Cacilda colocava a menina encardida embaixo do chuveiro, esfregava bem os pés vermelhos com a escovinha que fazia cócegas, e entregava a pequena cozinheira assim como ela havia chegado.
No caminho pra casa a menina contava tudo pra mãe, e pedia pra ir denovo no dia seguinte.
Um dia o dia seguinte ficou longe, e a menina cresceu, comprou suas próprias panelas e cozinhava sempre feliz em cima do fogão de verdade.
Mas o tempo voou e não deu tempo.
Ela se ocupou de tanto que só agora sentiu o quanto deveria ter feito um bolo pra aquela tia.
Mas ainda que não seja possível voltar atrás, ela lembra sempre daquelas tardes felizes em volta do fogo no quintal.
E vai mandando sinal de fumaça enquanto prepara o almoço de domingo.

terça-feira, 14 de julho de 2009

sábado, 4 de julho de 2009

O que resta do resto

A gente não se reconhece mais
Deve ser por causa da distância
Porque assim de longe, muito longe, você até parece melhor
Está mais magra, tem um cabelo novo, e ainda tem tempo de lixar e pintar as unhas toda semana.
Você até arrumou um amor, e quem diria agora ama a si mesma!
Assim de longe nada vai mal
Você passeia de uma lado pro outro, sorri seu riso branco, e ergue a cabeça contente.
Daqui parece que você é feliz, que esqueceu aquela deprê constante de tempos atrás
O tempo, vê se pode, virou até seu aliado
Não te deixou marcas e ainda deu conta de apagar aquelas cicatrizes feias que você tinha na alma

E eu não faço esforço pra te ver triste
Pra lembrar teus podres
Mas não me esqueço daquele dia
[E olha que pra isso me esforço]
Em que éramos amigas
Bem de perto
E mesmo encostando naquele monte de defeitos seu
Eu te via bonita
Tão bonita quanto agora

Mas a gente não se vê mais
E eu não sofro mais por isso
Porque te encontrar me deixava tensa, arredia, ansiosa
Agora o que me resta de você aparece só nos sonhos
E neles você é sempre melhor
A melhor amiga de todas que eu já tive.

Tudo no meu lugar

Ontem, depois dos longos dias vazios
Me enchi de você
E reparei que mesmo cheia
Espero que me dê mais
Porque fica sempre um espaço
Um lugar onde não nos misturamos
Aquela parte que reservo apenas pra você
Sem interferir, sem me acrescentar
E ali você é só você
Me dando seu tudo sem me deixar pra trás.

E que aquilo que nos preenche
Aos poucos nunca é demais.