quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Olfato

Eu gosto mesmo é do cheiro da terra molhada que invade aos poucos os cômodos do apartamento, assim fresco, lembrando a gente de olhar pra fora, de sentir o tempo.
Gosto de pensar que um dia ainda volto na velha casa, e me sento em meio às plantas do nosso jardim só pra enfiar os dedos na terra vermelha, encardindo as unhas de um marrom infantil, segurando na ponta dos dedos o tatu bola que morava ali, ouvindo o barulho dos outros enquanto escutava meu próprio silêncio.
Eu queria mesmo é achar mais um tesouro daqueles, só mais um. Do tipo que encontrava no meio da grama, perdido por mim uma semana atrás, tão esquecido que quando aparecia denovo em minhas mãos eu tinha a indescritível sensação da descoberta.

Ainda que distante, longe daquele tempo em que as horas custavam passar, eu me contento com o cheiro.

Aquele perfume que fez a noite de ontem me abraçar.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Amanhecer

De manhã a gente se enrosca no nosso bom dia e acaba atrasado para o trabalho,
E é bem naquele instante que eu me lembro do motivo
Das razões para estarmos ali, um deitado ao lado do outro
Gastando o tempo ao nosso favor
Combinando a rotina desejateitada que tentamos endireitar para o nosso próprio bem

É ali que eu encho os pulmões de amor
E refresco de ar o coração em chamas
Pra passar mais umas horas sem te ver
Esperando a gente se encontrar
Pra te contar o que fiz
E o que quero fazer depois que a gente deitar

De manhã a gente ganha tempo pra perder logo depois
E entrega um tanto de nós mesmos
Pra impregnar o outro de paz
De sossego.

Amanhã é outra manhã de nós dois,
Por hoje boa noite.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Lê: Mudada

Quando a gente muda é quase ano-novo
Mas é melhor, porque a mudança acontece do lado de fora antes que a gente desista por dentro
E depois de virar a vida de ponta cabeça resta apenas colocar de pé tudo o que ficou combinado
Ou então a gente descombina tudo aquilo porque depois de trocar de lado, o planejado fica meio sem sentido
E a coisa toda flui sem que a gente use muita força

Quando a gente muda é uma festa
Que acaba quando a gente reconhece no novo o habitual
Ou às vezes um pouco cedo demais, quando o dinheiro some antes que a gente trabalhe outra vez
O que era velho recebe uma importancia estranha
E a novidade chega sem bater na porata da casa onde moro agora
É preciso organizar-se, mas a vontade é mesmo esculhambar.

Pra fazer diferente.

Quando a gente muda trás um tanto de coisa inútil
Aquelas que não temos coragem de jogar fora
Coisas que são só coisas
E que diante de tanta reviravolta ficam sem lugar.
Quando isso acontece de verdade é fácil estranhar-se, esquecer-se
Mas também acontece da gente se admirar
E eu estou aqui, enlouquecida comigo mesma.

Mudada do vinho pra água.