quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O lugar das coisas

Fica esperando o dia certo de arrumar a casa, é que tem dias pra essas coisas, sabe? Aquele dia que acorda e pode perder ganhar tempo com as panquecas, esfregando no céu da boa a geléia vermelha, empurrando o doce com café expresso, vendo pela porta gigante o dia enorme lá fora. Só um dia assim, de leve calor e vento frio, pode servir como tempo pra colocar em ordem as coisas. Aí é preciso uma caixa de guardar segredos, um pedaço de fita pra amarrar os lápis coloridos, um prego pra colocar nas paredes aquele jeito antigo de ser. Depois passa uma flanela pra tirar a poeira, sem pressa, observando os nós da madeira, dedilhando a textura dos azulejos quebradinhos. E assim é o dia, junta duas fatias de pão italiano, coloca azeite, cream cheese, rúcula, mostrada, mel e tomate, faz de conta que é almoço. Deita no chão gelado, esfrega as mãos na barriga, o sol faz um desenho torto perto dos olhos e vai esquentando os cílios até eles derreterem, e se juntarem num soninho leve. Começa outra vez, pega as maquiagens quebradas e vai ajeitando numa caixa colorida, passa um pouco nas costas da mão pra lembrar do brilho, coloca a espuma velha na capa nova, deixa flores no centro da mesa, dança uma música. Quando vê já foi, agora pode morar, e vai testando os espaços, olhando lá fora o dia indo embora, o céu pipocando de estrelas e o mundo no mesmo lugar. Fica esperando o dia certo de arrumar a casa, dia de fazer a coisa certa.

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